Mala de mão era como meu pai me chamava porque eu só queria estar com ele, principalmente naqueles momentos mais inoportunos, quando tudo que os pais menos querem é saber dos filhos sob sua responsabilidade.
Na verdade eu acho que, como toda criança (ou a maioria delas) eu era metida e queria estar no meio das pessoas ditas “importantes”. Se meu pai estivesse conversando com prefeito, deputado, vereadores, era para o colo dele que queria ir.
Isso é minha mãe que me conta. Não lembro de muita coisa. Exceto uma vez que ele quis jogar baralho no bar (o que normalmente ele fazia muito em casa) e quis porque quis ir com ele – e fui. Não me pergunte detalhes dessa tarde, porque eu não vou lembrar, como não lembrarei detalhes de muitas coisas nas quais ele, meu velho pai, estava presente.
Dos cinco anos e meio em que convivi com meu pai tudo o que sei é de ouvir falar. Minha mente criou uma espécie de bloqueio entre aquele dia 3/6/1984 e o passado. Daquele dia sei tudo, desde a casa quase vazia pela manhã, ao doloroso momento de sua morte, com a casa enchendo de pessoas, o velório e o sepultamento.
Não lembro com tristeza é só saudade. Talvez certa frustração por termos ficado tão cedo sem ele.
Roroquinha é o diminutivo de “roca” (de saroca), como minha mãe me chama. É também como meu irmão mais velho costuma me chamar, principalmente quando está bebendo...
Minha mãe é essa pessoa, como todas as mães, incapazes de ser descrita em palavras. Uma mulher frágil, que se transformou numa leoa para criar os 5 filhos. Minha mãe é a expressão real da dedicação aos filhos.
Lembro da tristeza quando meu irmão não fez o vestibular porque não tinha o dinheiro pra inscrição. Ela chorou.
Lembro quando ela recebeu, depois de mais de um ano, a primeira pensão do meu pai, foi a primeira vez depois que ele morreu que ela comprou biscoito e refrigerante.
Lembro principalmente quando fui atropelada aos seis anos e minha mãe passou a noite acordada no hospital "espatando as muriçocas" que não me deixavam dormir.
Lembro quando recentemente operei o tendão de aquilles e minha mãe, mesmo cansada, levantava à noite para me levar ao banheiro.
Lembro de todas as vezes que precisei e preciso de qualquer coisa como ela fica preocupada e não sossega enquanto não consegue me ajudar.
Lembro quando mudei para Salvador do quanto ela me ouviu chorar e me incentivando a permanecer no trabalho e tentar me acostumar.
Eu sempre choro quando falo sobre isso e estou chorando agora quando escrevo. Não é que eu me sinta triste com o meu passado. Muito pelo contrário, eu acho que foi importante passarmos por tudo isso para que hoje valorizássemos o que há de mais importante em nossa família: a união.
Mãe nos ensinou que só com respeito e união podemos ser felizes. Não importa o quanto você tem em dinheiro. O que importa é quem você tem para celebrar.
É muito graças a esses ensinamentos que podemos nos reunir nos aniversários, no Natal, no São João, no Réveillon! Não importa onde estamos, o importante é estarmos todos juntos e disso fazemos questão!
Mala de mão e Roroquinha em homenagem aqueles que me deram a vida.
Meu pai, que foi embora tão cedo. Minha mãe, que me fez quem sou!